A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA EM ARTETERAPIA

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A IMPORTÂNCIA DA PESQUISA CIENTÍFICA EM ARTETERAPIA
por Jefferson Pessoa Hemerly

A Arteterapia é uma Prática Integrativa e Complementar em Saúde (PICS) e também uma prática terapêutica que busca sua regulamentação profissional no Brasil. A Portaria nº 849/2017 reconhece e insere a Arteterapia no SUS como uma PICS. A Arteterapia é uma racionalidade do cuidado geradora de saúde mental e bem-estar e, juntamente com outras racionalidades médicas e estratégias terapêuticas, totalizam, atualmente, 29 PICS. As profissões com maior reconhecimento público são fundamentadas pelo tripé: formação de excelência (graduação e pós-graduação lato sensu e stricto sensu), atuação profissional com qualidade e busca por evidências de boas práticas profissionais. Por isso os padrões mínimos de cada uma dessas dimensões se retroalimentam e resultam, em seu conjunto, na elaboração da identidade profissional, bem como na percepção social, econômica e cultural da profissão (BRASIL, 2017).

As arteterapeutas e os arteterapeutas (CBO 2263-10) são profissionais com curso superior e especialização em Arteterapia. A prática e a profissão é definida pelo domínio de linguagens artísticas; pelo conhecimento das propriedades dos materiais, como decide pela aplicabilidade dos materiais ou técnicas artísticas; pelo modo como prepara o setting terapêutico e estimula o processo arteterapêutico mediado pelas materialidades até um produto criativo final, cujo(s) elemento(s) expressivo e simbólico observado(s) pelo atendido, são desdobrados e amplificados. A formação profissional deve seguir as especificações da formação da União Brasileira de Associações de Arteterapia (UBAAT) que observa o seguinte currículo mínimo: Fundamentos da Arteterapia; Linguagem e práticas em Arteterapia; Fundamentos da Arte; Fundamentos psicológicos e psicossociais; Estágio e Supervisão – Prática; Trabalho de conclusão de curso (Carta de Canela-RS/2008; Norma Técnica 001/2023 UBAAT).

A ciência tem a habilidade de direcionar e influenciar o comportamento das pessoas e o curso dos eventos. A capacidade da ciência de transcender as fronteiras tradicionais e encorajar a colaboração interdisciplinar pode inspirar o desenvolvimento de novas profissões que combinam diversos campos de especialização para enfrentar desafios sociais complexos. A Arteterapia enquanto conhecimento é um campo novo que busca compreender relações e desfechos da cura através da arte (DEAVER, 2002). Portanto, multifacetado e complexo, e como todo novo campo buscando demarcar e se estabelecer. A pesquisa científica é essencial no desenvolvimento de uma nova profissão. Ao se envolver em investigação e análises rigorosas de seus processos e práticas, as trabalhadoras e trabalhadores podem ter insights valiosos que impulsionam a inovação e o avanço em seu campo. Através da pesquisa científica é possível abordar os desafios e necessidades específicas da profissão. A partir de novas descobertas, da validação ou rejeição de teorias existentes, os pesquisadores podem expandir os limites da base de conhecimento da profissão e fornecer uma base sólida para o desenvolvimento futuro. O processo de aprendizagem e exploração contínua é fundamental para a sustentabilidade e relevância de longo prazo de uma nova profissão (DUBAR, 1997; DUBAR, 2009).

Como são os estudos científicos no campo da Arteterapia? As investigações são teóricas (em geral, sobre os fundamentos da Arteterapia) ou experimentais (estudos qualitativos e/ou quantitativos). Para elaboração de um estudo, é necessário realizar uma revisão bibliográfica da literatura da área, selecionar perguntas e hipóteses de trabalho a serem testadas, eleger objetivos e métodos correspondentes, captar recursos financeiros de fomento à pesquisa e divulgar os resultados e conclusões das evidências encontradas em eventos científicos e a partir da publicação de livros e artigos científicos.

Os estudos em Arteterapia podem envolver os atributos e a aplicabilidade dos recursos artísticos, os serviços e as áreas de atuação dos arteterapeutas, bem como as populações que se beneficiariam da arteterapia. Quando esses estudos forem realizados com seres humanos é necessário o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) informando os objetivos do estudo, duração, procedimentos, potenciais riscos envolvidos, responsabilidades e benefícios esperados, bem como os incentivos à participação. A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), é uma comissão responsável por gerir os Comitês de Ética em Pesquisa (CEP) no Brasil e por implementar as normas e diretrizes regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos, e acompanhar os projetos aprovados pelos Comitês de Ética em Pesquisa (Resolução CNS nº 196/96, Resolução CNS nº 466/12). Muitas revistas indexadas não publicam trabalhos com seres humanos que não possuam parecer com aprovação do CEP (BRASIL, 2024).

O investimento profissional na pesquisa científica tem como objetivo principal conhecer benefícios, possíveis riscos e os efeitos da Arteterapia em diferentes populações e é um excelente indicador de crescimento profissional a partir do fortalecimento da identidade profissional e do comprometimento com a carreira. Ao produzir pesquisas rigorosas e baseadas em evidências, sujeitas à revisão e ao escrutínio por pares, as trabalhadoras e trabalhadores da Arteterapia podem demonstrar a validade e a relevância de seu trabalho para as comunidades acadêmicas e profissionais. Essa validação ajuda a estabelecer a nova profissão como um campo legítimo e respeitado, o que pode, por sua vez, atrair mais recursos, financiamento e suporte para seu desenvolvimento contínuo.

As competências e habilidade em pesquisas devem ser desenvolvidas num processo circular de investigação e prática. É necessário que as trabalhadoras e trabalhadores de Arteterapia aprendam a pesquisar e re-pesquisar subjetivamente dentro de sua própria experiência e objetivamente no campo arteterapêutico, pois têm a responsabilidade ética de não só estarem vinculados à pesquisa científica, mas também de selecionarem práticas profissionais que possuem evidências científicas de seus resultados e benefícios. Precisamos também nos comunicar com outros profissionais em áreas semelhantes ou diferentes com os quais compomos equipes de cuidado multidisciplinar/interprofissional para que possamos auxiliar nossos clientes/pacientes. Temos a responsabilidade de nos comunicar com outros profissionais que não entendem a linguagem da Arteterapia. E neste sentido, a pesquisa científica é fundamental nos diálogos com outros profissionais e saberes (JUE & HA, 2020). Ao comunicar suas descobertas de pesquisa por meio de publicações e apresentações revisadas por pares, as trabalhadoras e trabalhadores podem se envolver em um diálogo com seus pares, compartilhar as melhores práticas e promover um senso de comunidade dentro de sua profissão (ANDERSON, 2011).

O desenvolvimento da Arteterapia nos EUA foi facilitado por um crescente corpo de pesquisas que destaca seus benefícios terapêuticos. Como exemplo de desenvolvimento de pesquisa científica em Arteterapia, a comunidade americana de arteterapia, através da American Art Therapy Association (AATA) busca fornecer aos seus membros ferramentas, recursos e conexões essenciais para que tenham sucesso profissional, apoiou a publicação de inúmeros estudos sobre os benefícios da Arteterapia. A AATA agrega 4 revistas indexadas, o Journal of the American Art Therapy Association, Journal of Creativity in Mental Health, Arts & Health e International Journal of Art Therapy. Todas as revistas citadas exigem parecer com aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa. A associação através do seu Comitê de Pesquisa publica periodicamente revisões indicando as pesquisas de benefícios e impactos da Arteterapia (AATA, 2024).

No Brasil, 3 revistas pioneiras são referência editoriais na comunicação e divulgação do desenvolvimento do conhecimento no campo da Arteterapia e áreas afins: “Arteterapia: Reflexões” (avaliação de pares, versão online), do Departamento de Arteterapia do Instituto Sedes Sapientiae; “Revista de Arteterapia da AATESP” (publicação semestral, avaliação de pares, acesso aberto e gratuita, versão online. AATESP – Associação de Arteterapia do Estado de São Paulo) e a Revista Científica de Arteterapia “Cores da Vida” (publicação semestral, avaliação de pares, acesso aberto e gratuita, versão online), da ABCA (Associação Brasil Central de Arteterapia), onde são publicados artigos científicos, estudos de revisão bibliográfica, relatos de experiência, estudos de caso, resenhas de livros, resumos de monografias, dissertações e teses (SEDES, 2024; ABCA, 2024; AATESP, 2024). O amadurecimento e crescimento do campo arteterapêutico, sustentado pela produção científica e pela reflexão da prática cotidiana, tem gerado oportunidades ímpares de melhoria dos processos e instrumentos fundamentais à consolidação da pesquisa em Arteterapia e da profissão de arteterapeuta no Brasil. A pesquisa científica ajuda a esclarecer sobre a eficácia terapêutica, a elucidação dos mecanismos subjacentes, a versatilidade da Arteterapia no tratamento de diversas condições de saúde mental. Portanto, uma formação e prática de qualidade em Arteterapia incentiva o desenvolvimento de leitores críticos, capacidade de ler e criticar/avaliar artigos científicos, compreensão do desenho e da condução do estudo e da hipótese de trabalho e domínio epistemológico básico das abordagens e filosofias de pesquisa (FRIEDLAND et al., 2019; JUE & HA, 2020).

A pesquisa em Arteterapia, bem como seu ensino adequadamente nos cursos de formação é vital para o crescimento da profissão e para a prestação de serviços seguros e de qualidade. Assim, espera-se que os egressos dos cursos de formação possam realizar seus trabalhos a partir de evidências científicas fortes, realizar pesquisas durante sua carreira profissional, favorecendo o amadurecimento, as trocas profissionais, a inovação e o desenvolvimento da Arteterapia (KAISER et al., 2011). A pesquisa de resultados/eficácia; sobre processos e mecanismos da Arteterapia; sobre a validade e confiabilidade da Arteterapia; abordagens transculturais/multiculturais na prática da arteterapêutica, com populações diversas são algumas das perspectivas em elaboração no campo arteterapêutico. A realização de pesquisas científicas apoiam o amadurecimento e a prática profissional, contribuem para melhorar o atendimento ao cliente/paciente.

A pesquisa auxilia também na percepção social, promoção e compreensão coletiva sobre a atuação da Arteterapia como uma profissão regulamentada de saúde mental, desempenhando um papel crucial na melhoria da credibilidade e legitimidade da Arteterapia, facilitando a construção de uma comunidade que defende a profissão, apoia os arteterapeutas ao longo de suas carreiras e constroi suas práticas baseadas em conhecimentos.

Referências Bibliográficas AATA. Associação Americana de Arteterapia. Publicações. Disponível em: Acesso em: 03 de set. 2024. AATESP. Associação de Arteterapia do Estado de São Paulo. Revista Arteterapia da AATESP. Disponível em Acesso em: 03 de set. 2024. ABCA. Associação Brasil Central de Arteterapia. Revista Científica de Arteterapia Cores da Via. Disponível em: Acesso em: 03 de set. 2024. ANDERSON, F.E. Benefits of conducting research. Journal of the American Art Therapy Association, 18(3):134-141, 2011. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria Nº 849, de 27 de março de 2017. Inclui a Arteterapia, Ayurveda, Biodança…Terapia comunitária Integrativa e Yoga à Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares. Disponível em: Acesso em: 03 de set. 2024. BRASIL. Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde. Normativas. Disponível em: Acesso em: 03 de set. 2024. DEAVER, S.P. What constitutes art therapy research? Journal of the American Art Therapy Association, 19(1):23-27, 2002. DUBAR, Claude. A Socialização: construção das identidades sociais e profissionais. Porto, Portugal: Porto Editora, 1997. DUBAR, Claude. A Crise das Identidades: a Interpretação de uma Mutação. São Paulo: Edusp, 2009. FRIEDLAND, N.; MERRIAM, B.; BURT, H. You do what? Professional identity in art therapy students. Canadian Art Therapy Association Journal, 32(2):67-76, 2019. JUE, J. & HA, J.H. Influence of Art Therapy Students’ Art Practice on their professional identity and career commitment. Journal of the American Art Therapy Association, 38(1):13-21, 2020. KAISER, D.H.; PATRICIA, J.; BALL, B. Teaching art therapy research: a brief report. Journal of the American Art Therapy Association, 23(4):186-190, 2011. SEDES. Instituto Sedes Sapientiae. Publicação – Arteterapia: Reflexões. Disponível em Acesso em: 03 de set. 2024. UBAAT. União Brasileira de Associações de Arteterapia. Carta de Canela-RS, de 15 de novembro de 2008. Disponível em: Acesso em: 03 de set. 2024. UBAAT. União Brasileira de Associações de Arteterapia. Nota Técnica 001/2023. Disponível em: Acesso em: 03 de set. 2024